terça-feira, 12 de agosto de 2008

Algum tempo depois.

Ok. Demorei para voltar aqui. Minha vida ficou um pouco mais agitada.
Como decidi escrever um diário, ai vai um trecho, sobre quando sai para comprar tênis no último fim de semana.

"Um adendo ao fato de eu ter saído hoje.

Sai de mascara na boca e no nariz. Proteção a mais contra bactérias voadoras.
Cabeça raspada.
Moleton com capuz.
Sobretudo preto.
Calça jeans.
All-star.

As pessoas abriam caminho para mim.

Que horror.

Claro que é mais por causa da máscara. Mas na volta me olhei no espelho e vi que a roupa tinha ajudado.
Minhas impressões em relação às expressões e reações das pessoas quando me viam de máscara podem parecer falsas ou paranóia de quem está doente. Então, tentarei expor fatos.
Passei por uma ex-colega minha, com a qual tinha uma boa relação enquanto estudávamos juntos, mas não mantivemos grande contato e acho que não sabe que estou doente. Ela não me reconheceu (ok, eu estava de máscara e cabelo rapado) e fez a pior coisa que se faz para um doente, me olhou com cara de pena e cutucou a pessoa do lado para comentar.
Entramos eu e minha mãe numa loja para olhar tênis. Passamos por vendedores parados que nos olharam sem saber o que fazer e apenas o terceiro nos atendeu, este sim, sorridente.
Em outra loja, onde resolvemos fazer a compra, existem dois caixas, portanto duas filas. Entramos em uma, e esperamos a nossa vez. Quando efetuamos a compra, e esperávamos a impressão da nota, resolvi olhar para trás com calma. A fila do caixa do lado, tinha 5 pessoas. A fila atrás de mim. Atrás do cara com a máscara estava vazia.
Uma amiga da minha mãe nos encontrou nesta mesma loja. Chamou ela, minha mãe cumprimentou ela. E a amiga disse "teu guri, como está?" . ERA ÓBVIO QUE 'O GURI DELA' ERA EU, parado ali do lado de máscara. Quantos filhos com leucemia minha mãe teria? Mas não, ela não virou para mim e perguntou como eu estava. Ou perguntou, "esse que é teu filho?" Não, me ignorou.
Caminhando pela calçada, ao lado de carros parados esperando a sinaleira abrir, as pessoas de dentro do carro apontavam para mim.
Minha mãe parou de repente para ver um vitrine. Quando me dei conta, me virei repentinamente para encontrar com ela e topei com um senhor, que caminhava rápido de cabeça baixa. Ele se irritou e começou a reclamar. Quando olhou para o meu rosto, pediu desculpas.

Eu sei que é normal não se saber o que fazer.
Inclusive meus parentes as vezes. Querem saber o que posso e não posso fazer ou como estou reagindo ao tratamento. Querem saber isso por preocupação, para saber se comportar aqui em casa ou ainda pra saber se podem me dar algum doce ou algo assim. Só que, conversando comigo e com a minha mãe, se viram para ela e soltam frases como "fruta, ele pode comer?" "E ele pode usar o mesmo banheiro que a gente?" " e ele está muito cansado?" "e ele tá reagindo bem? tá caindo cabelo?"
Porra. Quando a intimidade é um pouco maior eu corto a resposta da minha mãe e digo "pode perguntar pra mim, eu estou aqui. Não, não posso comer nada que não seja frito, cozido, assado ou industrializado". Ou a resposta da pergunta feita. Quando falta intimidade ou estou cansado do mundo (sentimento comum de doentes em tratamento longo, outra hora eu explico) ignoro e deixou a mãe responder.
A mãe sempre responde sorrindo e enfatiza que estou bem. Ela é o máximo.

Enfim, deixo um conselho e uma informação.

Conselho: quando não souber o que fazer na frente de um doente que tu não conhece, sorria. Não aquele sorriso "olha como sou feliz", mas aquele sorriso simpático que diz "olá. sei que tu ainda é um ser humano e pode falar comigo como se eu fosse um também".
Sei que ficou estranho. Mas se tu não conhece a pessoa, esse é o tom. Tu é um ser humano, ela é outro e vocês vão interagir ali. Vender um suco, dividir a calçada, chingar por não olha por onde anda, cumprimentar porque os olhares acabaram se cruzando.

Informação: pessoas que caminham de máscara na rua estão SE protegendo de TI. Não o contrário.
É tu que pode infecta-las e não o contrário.

Sempre defendi o sorriso como forma de transmitir o que se está pensando. Sempre achei melhores que os olhos. Essa experiência de sair na rua privado de mostrar o que eu estava pensando/sentindo com meu sorriso ou a falta de me fez reforçar essa idéia.

Sorrisos sinceros."




Notícias da minha saúde:

Já fui pra casa.
Já voltei para o hospital.
Já sai e estou nos meus padrinhos.
Só saberei como será o próximo mês amanhã.

e ah. Raspei a cabeça.



Frase de filme: "Uma idéia não morre!"

Frase filosófica: "do que você tem medo?"

11 comentários:

Anônimo disse...

Ó eu aqui de novo dando um sinal! Espero não estar ficando chata demais ¬¬
Como sempre, adorei teu texto, ou seria um desabafo??
Presenciamos essas atitudes errôneas diariamente, e cada vez fico mais perplexa com isso.. realmente não sabemos reagir diante de situações inesperadas!
Só quero que saibas que penso em ti todo o dia e tento mandar muuuuita energia boa, tá?!
Espero que ainda lembre de mim, afinal, faz tempo que não nos falamos!
Saudade das nossas conversas mesmo sendo pelo msn! ;)
Beeijo, fica com Deus! Te cuida..

Victor Albaini disse...

É claro que tu já esperavas essas coisas, mas só vivendo pra ter idéia de como é.

Léo, não sei se eu to sendo chato te ligando sempre... Eu tenho evitado ao máximo, a Francine tem sido INSISTENTE em me mostrar o quanto eu posso ser inconveniente com isso. Enfim, quero saber de ti, quando a gente vai conseguir te ver de novo... Um monte de gente me pergunta por ti eu respondo que tu ta bem, do as últimas notícias e tal... Nem sei. Tem bastante gente com saudade aqui.

Já sabes que me chamaram na prefeitura, o Veraldo me propôs trabalhar meio turno lé e o outro na loja :P

Juro!

Muitos papéis, muita burocracia. Sobre estar cansado do mundo, continua firme, uma hora o equilíbrio chega ;)

Tenta dar sinal de vida...

FranBarenho disse...

Definitivamente eu queria estar aí, do mesmo modo que fui para Porto Alegre nas férias para poder te fazer companhia. Ficar aqui conversando via celular, blog ou msn não é a melhor maneira de manter contato, mas infelizmente tenho que ficar por aqui.

As portuguesas estão por aqui já. Depois te conto como elas são.

Já que o Victor citou meu nome...eu mexo com ele pq ele tá sempre falando ctg...mas isso não coisa para se tratar por aqui.
Eu tbm tento não ser inconveniente.

Mil beijos!

Ah...e eu me incluo na lista das pessoas com saudades por aqui. =)

Anônimo disse...

Talvez tu não lembre de mim, ou talvez lembre, te conheci na casa do jáder, numa janta, com vinho e mm's (não me pergunte como escreve mm's) onde jogamos dorminhoco e aquela coisa toda.
Bom independente se lembras ou não, energias positivas são sempre bem-vindas e saiba que tem mais alguém aqui torcendo por ti ;)
Não vou te mandar um beijo ou um abraço, mas um sorriso, vale muito mais!

Gafanha disse...

Continua firme primo, e registraando todas as impressões, afetadas ou não.

Victor Albaini disse...

São muitos documentos. Quando sair o teu nome eu aviso.

Qualquer coisa:

www.pelotas.com.br pra acompanhar as notícias

ou www.conesul.com.br pra ficar defasado em relação a elas, mas encontrar os editais

fora isso, muitos papéis! e nos falamos ao longo da semana ;)

te cuida
abração

Victor Albaini disse...

Achei a notícia:

http://www.pelotas.com.br/noticia/noticia.htm?codnoticia=14530

Anônimo disse...

oi, Léo. desculpa a invasão mas, enfim, tem um desvio do teu orkut para cá. fiquei de te mandar coisas e acabei não cumprindo (essa coisa do dia ter só 24h não foi bem pensada, por outro lado é tão longo...).
sabe, comentando um pouco a tua experiência expressionista (de enxergar as trevas humanas) lembro um pouco das nossas conversas: somos todos da mesma espécie, mas, se algo acontece com um outro ser humano e não quero pensar que possa acontecer também a mim...
mas eu queria mesmo era comentar o Buñuel que viveste:
é esperado que quando uma mãe está com um filho doente, as pessoas passem a se dirigir a ela como aquela que coordena, exatamente como quando ele (tu) era criança: o que é um absurdo! exatamente como no Fantasma da Liberdade: a criança está presente, mas todos INSISTEM em não vê-la em sala de aula, lembra?
querido, segura a onda que, tenho certeza, tudo vai dar pé!
beijo.

Andréa Schönhofen disse...

hey, sou eu ali em cima: deixei meu nome e saiu anônimo!!!!
vamos ver se agora vai! todo o caso,
Andréa

Heyner Mercado disse...

Não, eu não deveria voltar aqui, não tenho liberdade para isto e já tinha me feito a promessa de não voltar mais aqui. Mas sempre quebro as promessas que faço comigo mesmo.
Só vim aqui para dizer que esse teu último relato é para mim o reflexo do quanto as pessoas podem ser hipócritas diante das aparências. Ao ler uma parte, me vi indignado ao imaginar a cena da fila, e ninguém atrás de ti. Senti isso bater fundo como uma ofensa, um palavrão, uma pequena demonstração de como o ser humano demonstra tão claramente as suas diversas fragilidades no dia-a-dia, com atitudes quase inconsciente, porém bestas. Ridículas mesmo. As pessoas se protegem de muita coisa sem necessidade, mas isso até que me consola, em saber que essas pessoas são tão mascaradas. Toda a proteção da qual elas vestem é simplesmente a exposição de fraturas aos olhos de quem sabe entender isso. Se mostram frágeis, inacessíveis por defesa. Acho que é por isso que o ser humano é tão cheio de preconceitos. Se protegem daquilo que desconhecem, crianças conseguem ser mais sutis.
Tentei não ser prolixo, não deu.
Desculpa por falar demais, eu não tenho liberdade para isso, e nem sei se vai fazer alguma diferença tudo isso que eu resolvi dizer, enfim...
Mas saiba que, independente de qualquer coisa, eu tou por aqui torcendo pelo melhor, rezando e mandando todas as mais positivas energias que eu poderia mandar. Não sei se isso realmente ajuda, mas a torcida é real.
Sorte pra ti. E tudo de melhor.
Talvez eu volte aqui, talvez não. Se não comentar nada, terei lido.

Anônimo disse...

Bom dia Léo,

Interessante, triste e verdadeiro o que escreveste. Não desejo isso para nenhum ser humano da face da terra, nem para um animal, mas agora tu ainda, citastes várias vezes, que as pessoas se "afastavam" tinham preconceito devido aos acessórios que carregas devido a tua doença.
Agora, você e outras humanos que passam por isso, podem ter noção, uma pequena e dolorosa noção do que os negros passam, sendo a unica diferença é que nós, em muitos casos, não usamos mascaras apenas a face de gente que queria ser tratado igualmente.
Minhas sinceras desculpas se acabei te assustando com as palavras diretas e sem rodeios, eu sou assim! E do fundo do coração espero tua melhora definitiva e que assim possa de ver algumas vezes na gonça, no bar da mara, serginho.
Abraço